Projeto urbano de Guayaquil, no Equador, integrou Cerro Santa Ana à cidade
Pode ser culpa do vaivém frenético dos turistas. Ou das fachadas que seguem todas o mesmo estilo colonial, preservado e colorido. Pouco importa. Mais importante do que a causa, é o efeito que merece destaque. Ao contrário do Rio, onde se pode traçar a giz a fronteira exata entre as favelas e o resto da cidade, a urbanização do Cerro Santa Ana, em Guayaquil, no Equador, fez com que os limites entre os dois lados desaparecessem. Por trás da integração entre morro e "asfalto", está um pensamento único sobre a urbanização da cidade. Criado no início dos anos 2000, o programa Regeneração Urbana traçou princípios que nortearam a revitalização de diversos espaços públicos da cidade, como a Zona Portuária, bairros históricos e o Cerro Santa Ana. Idolatrado por uns, odiado por outros, o fato é que o projeto mudou a cara de Guayaquil.
Apesar de ter dividido ao meio o Santa Ana, separando com muros e portões a parte não pacificada da favela, a Regeneração Urbana não fez o mesmo em relação à região que cerca o morro. Endereço tradicional de artistas e boêmios, o bairro histórico de Las Peñas é uma charmosa sequência de ateliês, cafés e galerias de arte. As fachadas das casas do Cerro Santa Ana foram inspiradas no casario antigo de Las Peñas, o que faz os dois se confundirem naturalmente. Até as excursões turísticas programam os dois passeios no mesmo pacote.
Baixinho e risonho, o artista plástico Edgar Calderón dá nome a uma das galerias de arte locais. Equilibrado ao comentar a Regeneração Urbana, vê no projeto aspectos positivos e outros nem tanto.
- O governo quis mostrar uma cara bonita ao turista e nisso foi bem-sucedido. Mas, por trás disso, há um setor da sociedade, o mais pobre, que ficou marginal. Mas o que interessa ao mundo é ver a beleza:
O objetivo foi atingido. Saindo de Las Peñas, basta caminhar 200 metros à esquerda para chegar ao badalado píer de Guayaquil, o Malecón 2000 (Dique 2000). À beira do Rio Guayas, a zona portuária se tornou símbolo da nova imagem que a prefeitura queria projetar. Moderna, é toda decorada em detalhes. De triviais chafarizes e jardins até incrementadas estátuas, a zona portuária criou também uma série de atrações para usufruto da população: cinemas, teatro, um museu que conta a história da cidade e até um aquário público. Tudo isso, de certa forma, aos pés do Cerro Santa Ana.
Morro tem boa fama
A integração teve efeitos positivos sobre a vida dos moradores da favela. A pacificação e a transformação do Cerro Santa Ana em um local turístico fez com que pessoas de toda Guayaquil passassem a frequentar o morro. É o caso de Joseline Litardo, de 19 anos, e suas irmãs, Maria Belén, de 18, e Karen, de 13. Há um ano, todos os sábados, as três saem do bairro em que moram na Zona Norte da cidade para ir a um culto evangélico no Cerro Santa Ana. Sem medo ou preconceito de subir a favela.
- Somos apenas ouvintes do culto, mas gostamos de vir aqui, nos sentimos bem - conta Joseline, mãe de duas meninas.
Na contramão da Regeneração, áreas longe do centro estão esquecidas. A pobreza se aprofunda e, aos poucos, esses bairros se aproximam do que até ontem foi o Santa Ana.
Fonte: Jornal Extra
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